Aumenta o número de mulheres grávidas que procuram os serviços de corte vertical para evitar transmitir o HIV aos seus bebés, dizem as autoridades de saúde da província de central de Manica, mas atrair usuárias não é tão simples quanto parece.
Nos primeiros nove meses de 2006, o número de grávidas que testaram ao HIV duplicou o total de 2005, diz a Dra. Marília Pugas, médica chefe de Manica.
Entre Janeiro e Setembro, a possibilidade de fazer o teste de HIV foi oferecida à 24.068 mulheres grávidas nas consultas pré-natais. Das 17.543 que aceitaram o teste, 1.976 foram seropositivas. Destas, 934 administraram o antiretroviral nevirapina para evitar a transmissão do vírus ao bebé.
No ano anterior, 10.200 mulheres grávidas foram registadas em consultas pré-natais. O teste foi oferecido à 9.562 mulheres, mas 6.143 aceitaram. Das 676 que testaram HIV+, 261 usaram a nevirapina.
Com 1.359.000 de habitantes e uma seroprevalência de 19.7 por cento, Manica tem a urgência de evitar a transmissão de HIV da mãe para o filho.
Anualmente, nascem 30 mil bebés seropositivos em Moçambique e mais de metade morre antes de completar um ano, segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas para a Sida.
Apesar de disponível em 12 locais na província, a prevenção da transmissão vertical (PTV) apenas atinge uma fracção das grávidas seropositivas.
Desistência e preconceitos
Pugas explica que perdem-se candidatas ao corte vertical em cada etapa do processo - nas consultas pré-natais, aconselhamento e na maternidade.
“Existem preconceitos para com as pessoas vivendo com o vírus, o que dita algumas desistências,” diz a médica ao PlusNews.
Ir à consulta pré-natal é por si um desafio nas zonas rurais. Menos de metade dos partos em Moçambique são atendidos por profissionais.
Das 1.976 grávidas seropositivas, 512 partos foram em casa, onde algumas mães conseguem administrar nevirapina e outras não.
Para o caso desta província, há um agravante: a popular seita religiosa de Johannes Marenga desencoraja os seus fiéis a irem ao hospital.
Entre as grávidas que vão à consulta pré-natal, algumas recusam o teste, embora a percentagem das que aceitam seja crescente. Em 2005, atingiu 60 por cento e em 2006, 75 por cento.
Mas entre as que testam seropositivas, menos de metade chegam a administrar nevirapina, o que não se resume apenas em dar uma colher de nevirapina à mãe durante o parto e ao bebé antes das suas primeiras 72 horas.
Pugas explica que no “processo da PTV a mãe deve ter o cuidado de praticar sexo seguro, participar nas reuniões semanais de mães seropositivas, ter um parto na maternidade para receber uma boa assistência e continuar a frequentar a unidade sanitária até que a criança complete 18 meses e seja testada.”
Um factor fundamental da desistência é o medo que as mulheres têm de revelar a seropositividade aos maridos e familiares, receando a culpabilização e o abandono.
Labirinto da verdade
Josefina Guerra é um caso típico. Grávida de três meses, com um filho de dois anos no colo, aguarda a consulta pré-natal no longo corredor do Centro de Saúde 1o de Maio, na capital Chimoio. Guerra e o filho são seropositivos.
“Eu soube que era seropositiva quando estava na última gravidez…mas tive medo de contar ao meu marido, porque pensei nas consequências para os outros nossos dois filhos,” diz.
Guerra mudou de táctica quando o filho testou seropositivo aos 18 meses. “Discretamente, obriguei o meu marido a fazer o teste de HIV”, conta.
Deu positivo. Aí, conta Guerra, “me abri, mas passamos momentos de tensão, que já estão minimizados”.
Nesta gravidez, Guerra usará nevirapina, tem assistência psicossocial do grupo Moyonewana, que significa carinho para bebés, na língua Shona, e o seu filho recebe um complemento alimentar Plumpy’Nut contra a desnutrição.
Cada caso tem os seus contornos. Os familiares de Anita Kross, de 21 anos, descobriram que ela escondia a dose de nevirapina que recebeu na clínica. Testada seropositiva na gravidez, Kross não ousou contar ao marido.
A briga foi séria. Kross foi acusada de ter traído o marido e trazido a doença.
“Tivemos até que ser julgados pelo tribunal do bairro,” recorda ela. O tribunal logrou reconciliar o casal.
Dar leite artificial em vez do materno para evitar o contágio, como é recomendado às mães seropositivas, é mais um obstáculo.
Guerra não amamentou e espremeu o cérebro para explicar aos familiares as razões: “estava a violar um princípio étnico comum na minha zona. Justifiquei à minha maneira o porquê de não amamentar”.
Educação e extensão
Finalmente, poucas mães dão seguimento após o parto, segundo Pugas. A Direcção Provincial de Saúde testou apenas 111 crianças aos 18 meses.
Para se ultrapassar estas dificuldades, estão em curso trabalhos de sensibilização nas comunidades, formação de activistas e parteiras tradicionais.
Pugas diz que o maior desafio é atingir a meta do governo de oferecer o corte vertical a 80 em cada 100 mulheres grávidas.
Para isso, Manica pretende estender a PTV a mais 32 unidades sanitárias, acrescendo às 12 que já o oferecem em nove distritos.
A insuficiência de pessoal e de orçamento são os principais impedimentos da expansão.
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