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ÁFRICA AUSTRAL: Contando os votos e o custo da Sida nas eleições


Photo: IRIN
O meu voto é contra a Sida
CAPE TOWN, 25 Maio 2007 (PlusNews) - Nos últimos dez anos, os relatórios do governo zambiano ao Banco Mundial foram diminuindo cada ano, em tamanho e em qualidade. Passaram de 100 a 25 páginas e faltam estatísticas importantes.

Para certos especialistas, a razão é o aumento progressivo das mortes prematuras de funcionários públicos qualificados devido a Sida.

“Estes relatórios são um dos poucos dados oficiais que podemos monitorizar e comparar durante um longo período de tempo”, disse Nana Poku, professor de Estudos Africanos na Universidade de Bradford, no Reino Unido, e antigo diretor da Comissão das Nações Unidas sobre a Sida e a Governança na África.

Esta semana, Poku participou de uma conferência na Cidade do Cabo, organizada pelo Instituto pela Democracia na África do Sul (IDASA, em inglês) para tratar do impacto da Sida nas eleições, nos governos e no eleitorado no sul da África, o epicentro da epidemia.

No novo e conjetural setor da Sida e governança, a informação é dispersa, às vezes anedótica e difícil de achar. Na África, os atestados de óbito raramente mencionam a Sida.

Mais uma pesquisa conduzida pelo IDASA na Namíbia, Malauí, Senegal, África do Sul, Tanzânia e Zâmbia mostra perfis preocupantes.

Mortalidade surpreendente

No Malauí, entre 1994 e 1999, no pico da epidemia, 42 dos 193 Membros do Parlamento (MP) faleceram.

Embora os atestados de óbito não mencionassem a Sida, o porta-voz da Assembléia Nacional declarou em 2000 que 28 MP tinham morrido de doenças relacionadas à Sida durante o período de 1996 a 2000. A taxa de infecção pelo HIV no Malauí é de 14 por cento.

A boa notícia é que entre 2000 e 2004 só houve 12 óbitos de MP, e somente 5 entre 2005 e 2006. A diminuição a partir de 2000 coincide com o fato de que o tratamento antiretroviral (ARV) tornou-se mais barato e mais accessível.

A maioria dos MP que faleceram tinha entre 40 e 60 anos e faziam parte de um grupo sexualmente ativo, com recursos, e com muitos motivos de contrair o HIV.

“Os MP têm dinheiro, são populares e adotam comportamentos de risco”, disse a Dra Flora Kessy, cientista social no Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Saúde Ifakara, na Tanzânia.

Se os MP tomam ARVs, eles não falam no assunto. Nenhum MP na Africa Austral tem assumido publicamente ser seropositivo. No entanto, o seu padrão de óbitos é similar ao de seus eleitores: uma alta mortalidade, incomum entre pessoas relativamente jovens.

“Seria irrealista que nenhum MP fosse seropositivo”, disse Kondwani Chirombo, diretor do programa de Governança e Sida da IDASA.

O motivo deste silêncio é o medo.
''Revelar sua seropositividade é um verdadeiro suicídio político''


“Revelar sua seropositividade é um verdadeiro suicídio político”, disse o pesquisador Elijah Rubvuta, da Fundação para o Processo Democrático, na Zâmbia.

Sua pesquisa mostrou que os eleitores zambianos não querem eleger um candidato seropositivo, e que a Sida tornou-se uma “arma política”. Os candidatos que começam a perder peso ou parecer doentes perdem rapidamente sua credibilidade.

No ano passado, altos representantes dos partidos políticos disseram aos pesquisadores que os candidatos seropositivos são considerados como empecilhos políticos.

Mortes custam caro

Na Zâmbia, o número de eleições intercalares por causa do falecimento de MP aumentou consideravelmente nos anos 90, refletindo o aumento da taxa de seroprevalência que atinge agora 17 por cento entre os adultos.

Das 46 eleições intercalares que ocorreram entre 1964 e 1984, antes da Sida, menos de 7 por cento ocorreram por causa de um óbito por doença ou idade avançada.

Entre 1985 e 2003, com a propagação do HIV, houve 102 eleições intercalares, 60 por cento das quais em razão de óbitos por causa de doenças.


Photo: Governance and AIDS Programme
Número de Membros do Parlamento que morreram vítimas da Sida entre 1994 e 2006 no Malawi
O custo político imediato destas eleições é a falta de representação nas circunscrições. O tempo passa, enquanto as comissões eleitorais luta para angariar fundos.

No Malauí, levou mais de um ano para organizar eleições intercalares em seis circunscrições que ficaram vagas após as eleições de 2004. O custo? Quase meio milhão de dólares americanos para as seis, e uma frustração indefinível do eleitorado.

Na Zâmbia, uma eleição intercalar em uma grande circunscrição pode custar até 200 mil dólares americanos, e até 300 mil na Tanzânia.

O Lesoto, país pequeno e pobre, teve que desembolsar 130 mil dólares americanos para cada eleição intercalar, desde 2002. Três delas ocorreram por causa da morte de MPs.

Um outro custo político é a distribuição do poder nas eleições intercalares. Os partidos menores de oposição perdem, enquanto os partidos no poder, maiores, mais bem organizados e com mais recursos, ocupam as vagas.

Por isso, IDASA faz um apelo para que os países que praticam o sistema eleitoral de maioria relativa, que requer eleições intercalares, passem à representação proporcional, ou ao menos dispensem as eleições intercalares.

Eleitores ficam em casa

O eleitorado também sente o impacto da Sida.

Entre 1999 e 2003, a África do Sul registrou um aumento considerável - quase 200 por cento - da mortalidade entre eleitores de 20 a 49 anos, principalmente entre mulheres de 30 a 39 anos. Mais uma vez, esta situação refletiu os tipos de óbitos relacionados à Sida.

A África do Sul tem condições de manter uma lista de eleitores eficiente e eliminar os mortos delas. Países pobres como o Malauí não têm. Isto pode fomentar as acusações de eleitorado fantasma, além das listas eleitorais “inchadas” e inexatas.

Na província sul-africana de KwaZulu Natal, a mais atingida pela Sida, as pessoas seropositivas dos grupos-alvo entrevistados no estudo disseram que temiam a discriminação nas filas de votação. Eles disseram que os vizinhos se recusavam a ficar na fila com alguém que mostrasse sinais de doença, como feridas ou erupções.

Os jovens seropositivos da mesma província, no entanto, não tinham tanto medo de votar.


Photo: Nebert Mulenga/IRIN
Tanto eleitores como candidadatos sentem o impacto da epidemia
Na Tanzânia, na Zâmbia e na Namíbia, as doenças relacionadas à Sida assim como o fato de cuidar dos doentes e dos órfãos são alguns dos fatores que impedem os eleitores de votar.

Durante as votações, a comissão eleitoral contrata pessoal temporário, a maioria professores, um grupo com um alto nível de infecção pelo HIV.

Na África do Sul, estima-se que cerca de 13 por cento dos professores sejam seropositivos. Só em 2004, quatro mil professores morreram. Os ARVs manterão alguns deles em vida, mas muitos outros estão morrendo, o que prejudica a qualidade do trabalho eleitoral e requer um treinamento constante de novos recrutas.

Doadores contribuem à luta contra a Sida na região. Segundo o Prof. Poku, três quartos destes fundos vão para organizações não governamentais.

Contornar desta maneira o estado enfraquece sua capacidade de fornecer serviços e acaba prejudicando os cidadãos que este dinheiro deveria ajudar.

“Não é possível construir uma sociedade capaz de superar o impacto da Sida sem um estado competente,” diz Poku.

Ms/dc


Tema(s): (IRIN) Pesquisa

[FIM]

[Este boletim não reflecte necessariamente as opiniões das Nações Unidas]
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