ZIMBABWE: ARVs falsos ameaçam vidas

Photo: Anthony Kaminju/IRIN  |
Acredita-se que o mercado de medicamentos falsificado seja altamente lucrativo |
HARARE, 4 Setembro 2007 (PlusNews) - Activistas advertem: o alto custo dos medicamentos antiretrovirais (ARV) e mecanismos de controle inadequados no Zimbabwe estão favorecendo um próspero comércio de falsos ARVs por comerciantes ilegais.
A Autoridade Reguladora de Medicamentos do Zimbabwe (MCAZ, em inglês) emitiu recentemente um comunicado alertando a população que comerciantes estavam importando e vendendo ARVs falsificados a seropositivos inocentes que precisam do tratamento.
Pontos de venda não autorizados e insalubres, como mercados de pulgas ou salões de beleza, estavam sendo usados para a comercialização dos falsos medicamentos, causando preocupação quanto ao comprometimento da saúde dos pacientes e a possibilidade que eles desenvolvessem resistência às verdadeiras drogas.
“Esta é uma prática perigosa porque estes medicamentos podem ter sido expostos a condições de estocagem impróprias e perigosas, afetando assim sua qualidade e eficiência. Esses medicamentos podem ser falsificados, adulterados e contaminados, tornando-os ineficazes e às vezes perigosos”, advertiu o MCAZ.
Um mercado em expansão para ARVs falsos
Acredita-se que o mercado de falsos medicamentos seja extremamente lucrativo. Um semanário local independente, o Financial Gazette, publicou recentemente uma declaração do ministro da Saúde, David Parirenyatwa, segundo a qual o governo teria chamado outros interessados para avaliar a magnitude da venda de medicamentos falsos.
Chitiga Mbanje, coordenador de formação do The Centre, organização não-governamental (ONG) que auxilia pessoas vivendo com HIV e Sida, afirmou que eles também estavam reunindo provas de venda dos falsos medicamentos.
“Existem vários relatos da venda destes medicamentos, mas o mais importante é que os interessados reúnam provas empíricas suficientes quanto a sua origem, locais exatos de venda, quantidades, pessoas envolvidas, para que sejam criadas e adotadas estratégias globais”, disse Mbanje.
Tapiwa Bwakura, secretário-geral da Associação Médica do Zimbabwe (ZIMA, em inglês), disse: “Estamos extremamente preocupados com os relatos de pacientes que compram os ARVs, mas precisamos de relatos quantitativos para tomarmos medidas significativas.”
“Existe o perigo de uma sensacionalização da questão. Nós estaríamos falhando em tranquilizar os pacientes se apenas alertarmos sobre as drogas falsas sem nos armarmos com fatos reais.”
John Madzima, 32 anos, mora na capital Harare. Segundo ele, são os consultórios ilegais, em número cada vez maior, os responsáveis pelo desenvolvimento do comércio de falsos medicamentos. Ele foi diagnosticado seropositivo há cinco anos e começou a tomar ARVs dois anos depois.
“Com a crescente escassez de ARVs, eu fui uma das vítimas de pessoas inescrupulosas que usam consultórios ilegais como pontos de venda”, disse Madzima, um ex-soldado que se aposentou do exército por motivos médicos.
Ele comprou os medicamentos no consultório de um jovem médico cuja licença havia sido cassada pelo roubo de medicamentos do dispensário de um hospital de referência público.
“Eu não tinha motivos para suspeitar que os ARVs à venda eram falsos porque o consultório parecia autêntico e ele parecia saber o que fazia; eu aproveitei a oportunidade quando soube que ele tinha medicamentos em estoque”, disse Madzima, que antes comprava seus medicamentos no dispensário do exército.
Quando ele foi ao consultório, o “médico” lhe disse que não tinha o tipo de ARV que lhe tinha sido prescrito e o convenceu a comprar um outro, que era falso.
Sua saúde logo começou a se deteriorar e ele procurou um conselheiro de Sida em seu antigo local de trabalho em Harare, que recomendou que ele denunciasse o ocorrido à polícia. O falsário, porém, quando soube de sua prisão iminente, logo fechou o consultório que alugava de um médico que tinha se mudado para a África do Sul, e fugiu.
Estima-se que mais de 300 mil zimbabuenses necessitem de tratamento ARV, mas o número dos que o recebem é bem menor. Em 2006, o governo anunciou que pretendia fornecer o tratamento ARV a 300 mil pessoas até 2010. Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 40 mil pacientes estavam em tratamento no final do ano passado.
No entanto, Human Rights Watch (HRW), que trabalha pela proteção dos direitos humanos internacionalmente, disse que no segundo semestre de 2006, “somente cerca de 23 mil dos 350 mil zimbabuenses que necessitam a terapia antiretroviral (ART) estavam recebendo ARVs.”
Na recente seção de abertura do Parlamento, o presidente Robert Mugabe declarou que o governo tinha conseguido aumentar o número de participantes do programa de distribuição de ARVs para 62 mil, acrescentando ainda que este número poderia dobrar até o final do ano.
Colapso do setor de saúde
O Congresso de Sindicatos do Zimbabwe (ZCTU, em inglês), central sindical que representa milhares de trabalhadores e que tem pressionado pelo maior acesso ao tratamento ARV para seus membros, descreveu a venda de falsos medicamentos como “um problema sério que requer ação imediata.”
“Pelas nossas avaliações, observamos que a presença de falsos ARVs é bastante generalizada e estamos preocupados pelo fato de que milhares de infectados podem ter morrido ou acabarão morrendo devido aos efeitos fatais da ingestão de falsos medicamentos”, disse o presidente do ZCTU, Lovemore Matombo.
Ele acusou as autoridades de imigração, o sistema de segurança do país e as autoridades sanitárias, que não conseguiram impedir o fluxo de importação dos falsos medicamentos.
“Na verdade, o sistema de contrôle faliu, e esta é a razão pela qual os traficantes têm conseguido fazer entrar tantos medicamentos no país. Nós desconfiamos que todo o sistema de monitoração esteja atacado pela corrupção. A distribuição dos medicamentos deveria ser supervisionada por controladores de qualidade, mas o fato de que os pacientes ainda comprem falsos medicamentos em lugares públicos é um mistério”, disse Matombo.
Uma inflação galopante e a escassez de moeda estrangeira têm paralisado o setor da saúde, provocando falta de medicamentos, de equipamento médico e até de profissionais da saúde, que emigraram em busca de melhores salários e condições de vida.
Nas farmácias públicas, um coquetel de medicamentos ARV custa até Z$ 500 mil, o que os coloca fora do alcance da maioria dos pacientes, que ganham menos de Z$ 3 milhões por mês ou são desempregados.
Nas farmácias privadas, eles custam até quatro vezes mais que nos dispensários públicos subsidiados. Segundo HRW, “muitos zimbabuenses que compravam os medicamentos ARV do setor privado estavam passando para os programas de acesso aos ARVs subsidiados pelo governo porque não podiam mais pagar pelo tratamento no setor privado.”
A HRW disse que certas ONG lhes haviam comunicado que “a capacidade limitada do setor de saúde em fornecer acompanhamento médico adequado ao grande número de pacientes HIV/Sida, resultado da emigração massiva dos equipes de saúde competentes” também tinha um efeito sobre o programa de distribuição.
Matombo destacou que o alto custo dos ARVs tornam os pacientes presas fáceis para os traficantes que oferecem os falsos medicamentos a preços baixos; por desespero, alguns seropositivos estavam até recorrendo a remédios que não haviam sido prescritos.
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[Este boletim não reflecte necessariamente as opiniões das Nações Unidas] |
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