TANZÂNIA: Aumento do uso de drogas injectáveis aumenta casos de HIV

Photo: Stop Addiction  |
Governo pretende desmantelar redes de contrabando da heroína e morfina |
STONE TOWN, 9 Agosto 2007 (PlusNews) - Fatma Shaibu mantém um horário regular. Durante o dia ela faz trabalho doméstico em Stone Town, o bairro histórico da capital da ilha de Zanzibar, no Oceano Índico, e à noite vende sexo na discoteca local.
Sua fuga para essa dura rotina são três injecções de heroína – de manhã, à tarde e à noite. Entre as picadas, essa mãe de quatro se mantém alta fumando drogas no papel e no cachimbo.
“Estou cansada”, disse Shaibu, de 40 anos, levantando o lenço de cabeça usado pelas muçulmanas e revelando veias arroxeadas e inchadas no pescoço, resultado de anos de injeções de heroína. As veias em seus braços e pernas há muito entraram em colapso.
“Mas não é fácil arranjar dinheiro todos os dias”, disse. “Faço tudo isso porque preciso fumar.”
Shaibu é um caso clássico de como o HIV se propaga em Zanzibar. Por trás da linda costa marítima da ilha, com palmeiras e praias exóticas, problemas como drogas e prostituição estão à espreita, dificultando a luta contra o HIV e a Sida.
Até agora, a seroprevalência em Zanzibar ainda está abaixo de um por cento na população de cerca de um milhão de habitantes e majoritariamente muçulmana. Essa taxa é muito mais baixa que a encontrada na Tanzânia continental, a cerca de 50 quilómetros, onde a seroprevalência é de sete por cento numa população de 38 milhões.
Entretanto, as autoridades de saúde de Zanzibar alertam que a seroprevalência entre os consumidores de drogas injectáveis e prostitutas é muito maior que na população geral.
Um estudo com 508 consumidores de drogas injectáveis realizado em 2006 concluiu que 26 por cento deles eram seropositivos, enquanto 22 por cento sofria de hepatite C e 15 por cento de sífilis.
O estudo também observou que esses usuários tinha mais tendência a iniciar a vida sexual ainda na adolescência; a ter múltiplos parceiros; e a fazer sexo sem proteção, aumentando ainda mais o risco de contrair HIV.
“Este não é um daqueles estudos que podem ser arquivados, o peso é muito grande”, disse Mohammed Dahoma, líder do estudo e funcionário da principal unidade médica de Stone Town, o hospital Manzi Moja.
“É uma ameaça: [o consumo de drogas injectáveis] é um dos principais propagadores da epidemia de Sida e afecta principalmente os jovens”, acrescentou.
Drogas e Sida
Há uma preocupação crescente de que o peso da Sida em Zanzibar aumente com mais drogas disponíveis. Segundo a polícia local, três por cento da população adulta consome drogas ilegais – e o número está aumentando.
Zanzibar fica na rota do tráfico de droga entre a Ásia, o Oriente Médio e a Europa, o que tem contribuído para um maior consumo de heroína na região, segundo a Comissão da Sida em Zanzibar.
Em 2005, a polícia interceptou 375 toneladas de marijuana, 101,5 quilos de heroína e 35 quilos de morfina, entre outras substâncias proibidas. Nos últimos dois anos, 11.500 pessoas foram presas sob acusações relacionadas a drogas, de acordo com a unidade de anti-narcóticos da Tanzânia.
Muitos consumidores de drogas injectáveis partilham agulhas usadas ou usam técnicas perigosas para economizar dinheiro, conhecidas como “sangue rápido” (do inglês “flash blood”), em que o consumidor injecta heroína ou outra substância ilícita e depois enche a seringa com seu sangue. Essa seringa é então passada para que um segundo usuário se injete.
A pobreza é parte do problema em Zanzibar, onde a renda média per capita é de US$ 330. O estudo de 2006 mostrou que os dependentes muitas vezes recorriam à prostituição para alimentar o vício, que pode custar cerca de US$ 8 por dia.
Alguns observadores também reclamam que o turismo, uma das maiores fontes de receita em Zanzibar, está contribuindo para um estilo de vida ocidental “não-islâmico.”
“Há aspectos de mudança de vida aqui, com mais turistas chegando e um ritmo de vida mais acelerado que no passado”, disse Sadaat Idi, da Comissão da Sida de Zanzibar.
Mussa Ali, oficial de projectos na ZAYADESA, uma clínica de HIV em Stone Town, disse que seus 500 membros seropositivos fazem o melhor para proporcionar suporte uns aos outros.
“Não perguntamos como contraímos a doença; simplesmente tentamos ajudar a aliviar o peso que ela traz”, disse.
Difícil de parar
Shaibu já tentou parar com as drogas e em ambas as ocasiões acabou no hospício de Zanzibar, de onde saiu logo porque, segundo ela, era muito difícil estar com pacientes com sérios problemas psicológicos.
Ela responsabilizou a falta de uma unidade dedicada a tratamento de drogas e de serviços de apoio adequados para que ela se livrasse da droga definitivamente.
Dahoma disse que esforços para alcançar os usuários de drogas deveriam incluir melhor tratamento e cuidados, além de programas voltados aos jovens para desencorajá-los do vício.
O governo lançou recentemente um programa de dois anos, no valor de US$3 milhões, para combater a Sida em Zanzibar. Ele inclui estratégias para desmantelar redes de contrabando da droga e melhorar os serviços de saúde para usuários de substâncias ilícitas.
Este não é um daqueles estudos que podem ser arquivados, o peso é muito grande. |
O esforço foi recebido com agrado por defensores da saúde. “Nós não temos recursos para lutar contra isto se o problema aumentar – é encorajador que o governo esteja investindo nisso agora”, disse Dahoma.
Em Julho, a Tanzânia também deu início a uma grande campanha para testar quatro milhões de pessoas para HIV até o final de 2007, com tratamento antiretroviral gratuito para todos os que necessitarem dele.
O presidente Jakaya Kikwete foi testado em público para ajudar a quebrar o estigma e discriminação relacionados ao HIV e à Sida.
Mas Shaibu, que não sabe o seu estado de HIV, disse que vai ser preciso muito mais para mudar o seu caótico estilo de vida.
“Aqui, o governo não entende o problema da heroína. As pessoas simplesmente me dizem para parar, mas eu não consigo fazer isso sozinha. Preciso de um lugar onde possa ir e estar em paz, sem tentações”, disse.
|
Tema(s): (IRIN) Prevenção
[FIM] |
[Este boletim não reflecte necessariamente as opiniões das Nações Unidas] |
|
|
|
|