SENEGAL: Detenção de activistas homossexuais faz recuar a luta contra a SIDA
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Photo: Obinna Anyadike/IRIN ![]() |
Muitos activistas homossexuais tiveram que se esconder depois do julgamento |
DAKAR, 23 Janeiro 2009 (PlusNews) - Organizações internacionais de SIDA condenaram a detenção de nove activistas de SIDA Senegaleses por causa da sua orientação sexual, dizendo que esta ameaça inverter os progressos feitos na luta contra o HIV no Senegal.
Os homens, que estavam envolvidos em proporcionar serviços de prevenção, cuidado e tratamento às comunidades lésbica, homossexual, bissexual e transsexual (LGBT) no Senegal foram condenados a oito anos na prisão.
A homossexualidade é punida com até cinco anos na prisão, segundo o código penal senegalês. Neste caso, o juiz adicionou mais três anos por conspiração criminal.
Numa declaração divulgada na semana passada, a Sociedade Internacional da SIDA, que promove novas pesquisas e boas práticas de HIV e é a organizadora da Conferência Internacional sobre a SIDA, e a Sociedade para SIDA em África (SAA, em inglês), que trabalha para reduzir a propagação do HIV, dizem que a criminalização e discriminação de quaisquer grupo de indivíduos só serve para exacerbar a epidemia do HIV ao negar serviços e mensagens relevantes de prevenção.
“A detenção destes homens baseada meramente na sua orientação sexual representa um sério revés na resposta senegalesa ao HIV, que é amplamente vista como um modelo em África,” disse Joanna Mangueira, Presidente da SAA.
Cheikh Niang, professor de antropologia na Universidade de Cheikh Anta Diop em Dakar, a capital do Senegal, e autor de estudos sobre a SIDA e sexualidade no país, concordou que a detenção dos activistas foi “contra-producente”.
“A severidade da sentença criou uma atmosfera de pânico entre as organizações que trabalham na prevenção e tratamento com homens que fazem sexo com homens (MSM, em inglês),” disse.
Michel Bourelly da AIDES, uma organização internacional que trabalha com homens que fazem sexo com homens no Senegal, disse que activistas homossexuais estão escondidos ou fugiram do país desde o julgamento. “Tudo parou. As organizações que fornecem serviços a homossexuais e MSM estão com muito medo de trabalhar.”
Contradições
Segundo Bourelly, os homens foram detidos enquanto participavam duma reunião acerca da prevenção do HIV. Foram confiscados panfletos, preservativos e modelos de pénis por serem considerados material pornográfico.
“Os preservativos que foram considerados material pornográfico durante o julgamento foram fornecidos pelo governo senegalês,” ressaltou ele.
A já elevada discriminação contra a comunidade LGBT no Senegal aumentou no início de 2008 após uma revista local ter publicado fotografias que alegadamente retratavam um casamento entre dois homens. A libertação de cinco homens detidos por terem alegadamente participado no casamento provocou protestos violentos em Dakar.
Um jovem homossexual membro de uma organização de HIV/SIDA que trabalha com MSM no Senegal, que não quis ser identificado, confirmou que a intolerância em relação à homossexualidade aumentou.
“A violência física é mais comum agora. Antes, tínhamos grupos que nos ajudavam – eles davam-nos coragem para nos encontrarmos. Costumávamos trabalhar na área da prevenção, mas agora é demasiado perigoso,” disse ele.
Os homens detidos foram presos apenas duas semanas após o Senegal ter sido o país anfitrião da Conferência Internacional sobre a SIDA e ITSs em África (ICASA), onde oradores deram ênfase à importância de abordar as necessidades das minorias sexuais nos programas de SIDA em África. Mais de 50 activistas homossexuais participaram nesta conferência.
Numa entrevista à IRIN/PlusNews em Novembro de 2008, Souleymane Mboup, presidente da ICASA, disse que os MSM eram uma realidade em África que não podia ser ignorada.
“Esta é uma questão de que não podemos fugir se quisermos avançar [na luta contra o HIV],” disse ele. “Muitos países, incluindo o Senegal, têm que abrir os olhos e aprender. Temos que pensar acerca das estratégias que precisamos adoptar.”
Em 2007 o Fundo Global para Combate à SIDA, Tuberculose e Malária concedeu ao Senegal US$32 milhões para fortalecer a sua resposta ao HIV/SIDA. Parte da subvenção foi destinada a programas que tivessem como alvo “grupos vulneráveis”, incluindo MSM, com campanhas de prevenção, preservativos e clínicas para MSM durante os cinco anos seguintes.
“Foram dadas quantias de dinheiro consideráveis ao Senegal para que as necessidades dos MSM fossem abordadas nos seus programas nacionais de SIDA”, disse Bourelly. “Mas agora estamos a prender as pessoas a quem teríamos que atingir com os nossos programas.”
Ninguém do Conselho Nacional do Combate à SIDA, um dos dois principais recipientes do financiamento do Fundo Global, esteve disponível para comentar. Abdoulaye Wade, director da divisão da SIDA no Ministério da Saúde, disse que o governo continua a proporcionar serviços de prevenção e tratamento a MSM, mas não especificou exactamente que serviços.
Regressivo
Joel Nana, director de advocacia no escritório da Comissão Internacional de Direitos Humanos de Gays e Lésbicas (IGLHRC, em inglês) na África do Sul, disse que o Senegal já foi elogiado pelos seus programas progressivos e inclusivos de HIV/SIDA.
“O Senegal foi o primeiro país em África a abordar MSM nos seus programas de HIV, por isso isto [o julgamento] é realmente um passo atrás,” disse ele.
Embora o Senegal tenha mantido uma seroprevalência baixa de cerca de um por cento entre a população geral, dados oficiais e estudos realizados na Universidade de Cheikh Anta Diop sugerem que cerca de 21,5 por cento de MSM eram seropositivos em 2005. Os estudos também descobriram que 80 por cento dos MSM tinham parceiros femininos e masculinos.
“É um erro considerável pensar que isto é apenas um problema homossexual,” disse Bourelly. “A maioria dos MSM tiveram ou continuam a ter sexo com mulheres, por isso o impacto de efectivamente fechar programas de MSM será considerável na população em geral.”
Grupos de direitos humanos e organizações de SIDA estão a pedir a libertação imediata dos nove homens detidos e uma mudança no código penal do Senegal. Niang concordou que está na hora de debater os méritos da lei.
“Não adianta dizer que homens que têm sexo com homens não existem nas nossas sociedades,” disse ele. “Existem e é um fenómeno antigo. Ao ignorar a sua existência, não vamos ser capazes de responder adequadamente [à epidemia do HIV]."
ft/ks/he/mg/ll
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Tema(s): (IRIN) , (IRIN) PVHS/ONGs, (IRIN) Estigma/Direitos Humanos/Leis
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[Este boletim não reflecte necessariamente as opiniões das Nações Unidas] |
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