ÁFRICA: Sexo ou abstinência? A difícil decisão das seropositivas
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Quando o assunto é sexo, a discussão vai muito além do simples prazer no caso de mulheres seropositivas |
NAIRÓBI, 5 Julho 2007 (PlusNews) - Abstinência ou uma vida sexualmente activa? O dilema, enfrentado diariamente por mulheres seropositivas no mundo todo, foi uma das discussões que marcaram o início da Primeira Conferência Global sobre Mulheres e Sida, na capital queniana, organizada pela Associação Cristã Feminina Mundial.
A abstinência é um dos pontos mais controversos nos debates sobre a Sida. Muitas campanhas têm pregado a abstenção do sexo como a melhor forma de prevenir a doença, gerando fortes críticas quanto à sua real eficácia.
Mas no caso de mulheres seropositivas, será que a abstinência é uma alternativa desejável? Ou uma vida sexualmente activa ainda é a preferência?
Para a maioria das mulheres entrevistadas pelo PlusNews, a abstinência é uma opção pessoal – uma que nenhuma delas pareceu abraçar.
“Somos seres sexuais e temos direito de ter relações. Parte de ser saudável é também ser sexualmente saudável”, disse a activista nigeriana Rolake Odetoyinbo, da organização não-governamental Positive Action for Treatment Access. “As seropositivas devem estar em paz com a própria sexualidade para se proteger.”
Uma nova realidade trazida aos seropositivos pela expansão massiva do tratamento antiretroviral é a recuperação da saúde, da esperança do futuro, da auto-estima e, consequentemente, do desejo sexual.
“Você sabia que os antiretrovirais dão tesão?”, brincou Lutanga Shaba, seropositiva e diretora executiva da organização não governamental The Women’s Trust, no Zimbabwe. “Não dá para fingir que o sexo não está acontecendo.”
Pela lente dos direitos humanos
Um dos consensos do encontro foi olhar para a sexualidade de seropositivas através das lentes dos direitos humanos, considerando-as não apenas mulheres vivendo com HIV, mas como seres humanos com direitos garantidos de trabalho, saúde, família e – por que não? – uma vida sexual.
Foi a partir dessa perspectiva que se levantou uma questão cada vez mais premente na vida das mulheres com HIV: a necessidade de abrir a seropositividade ao parceiro.
A preocupação se refere à linha ténue que separa a necessidade de se proteger a si mesma e ao parceiro da infecção ou reinfecção, e uma quebra da privacidade quanto à seropositividade, já que “revelar a condição deve ser um desejo, uma vontade, mas não uma obrigação”, disse uma activista que não quis se identificar.
Um dos grandes temores em relação à essa linha é que outros países sigam o exemplo da Namíbia, que actualmente avalia uma lei que autorizaria a prisão de um seropositivo que infectar alguém que não sabe da condição de seu parceiro. Outros países como Uganda e Suazilândia discutem leis com penas de prisão mais severas para violadores seropositivos que os seronegativos.
Apesar dos medos de muitas, Deborah Williams, de Tobago, representante da Rede Regional Caribenha de Pessoas Vivendo com HIV/Sida, reforçou a importância de se revelar a seropositividade ao parceiro.
Somos seres sexuais e temos direito de ter relações. Parte de ser saudável é também ser sexualmente saudável. |
“Se um parceiro não fala que é seropositivo, essa é a verdadeira violência contra a mulher. Temos que diminuir as taxas de transmissão sendo abertas, falando de nossa condição, para nossa protecção e a dele. Esse tem que ser nosso compromisso”, disse.
Shaba citou como outro obstáculo nesse dilema a desigualdade entre os géneros, que coloca as mulheres em desvantagem.
“Se um homem negativo descobre que sua noiva é positiva, ele certamente vai abandoná-la. Mas se um homem é positivo, o casamento com certeza vai acontecer, porque ele nem vai pedir para ela fazer o teste. É uma questão de género”, afirmou.
Redefinindo os termos
Não só nenhuma das entrevistadas pareceu abraçar a abstinência como forma de protecção como muitas sugeriram a mudança da estratégia ABC – Abstinência, Fidelidade e Preservativos (da sigla em inglês) para prevenção da Sida.
“Pode jogar o ABC no lixo, ele não funciona”, disse Shaba.
Odetoyinbo, da Positive Action for Treatment Access, sugere a adopção de uma fórmula mais realista, elaborada na conferência mundial da Sida em Bangkok, na Tailândia.
O método ABCDEF – Admitir e aceitar que o sexo acontece, Ser realista, Escolhas, Diminuir o número de parceiros sexuais ou Adiar o início da vida sexual, Fortalecimento e Independência financeira (das siglas em inglês) - tem levantado adeptos devido à sua abordagem mais realista e complexa da pandemia e da sexualidade.
No entanto, o director executivo do Programa Conjunto das Nações Unidas para o HIV/Sida, Peter Piot, prefere ser mais cauteloso. Segundo ele, muitos programas de prevenção actuais se baseiam em realidades de 20 anos atrás, mas muitas conquistas já foram feitas.
“Temos que tomar cuidado para não jogar o bebê junto com a água do banho. Os preservativos continuam funcionando, mas apenas eles não funcionam. Tudo que tem a palavra apenas não funciona para a Sida. É sempre um conjunto de factores.”
ll/ms
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Tema(s): (IRIN) Prevenção
[FIM] |
[Este boletim não reflecte necessariamente as opiniões das Nações Unidas] |
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