MALI: Informar as crianças da sua seropositividade ajuda elas a viver com o HIV
Photo: IRIN |
Quando a criança sabe porque toma os remédios, ela cria uma verdadeira adesão ao tratamento antiretroviral |
BAMAKO, 4 Maio 2007 (PlusNews) - Vestindo um conjunto de cintura baixa, com um livro embaixo do braço, Maimouna, vai ao hospital Gabriel Touré de Bamako, encontrar a equipe médica que decidiu, há três meses, revelar-lhe sua seropositividade para ajudá-la a conviver melhor com a infecção.
Antes disso, esta menina de 13 anos, órfã de pai e mãe, que faleceram de infecções relacionadas ao HIV/Sida, ignorava tudo sobre o mal que a corrói desde seu nascimento, e confessa que detestava o xarope que era forçada a tomar.
« Eu nem sempre o tomava, mas agora que sei, sou mais cuidadosa », disse ela.
Maimouna faz parte das crianças seropositivas de seis a quatorze anos que recebem acompanhamento no serviço de pediatria do hospital Gabriel Touré, no centro da capital do Malí, e vem regularmente reunir-se em uma sala com paredes cobertas de personagens de bandas desenhadas, jogos e televisão.
É nesta unidade, no âmbito do programa Criança e HIV/Sida do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), que foi iniciado o projeto para a melhora do acompanhamento terapêutico e nutricional do qual Maimouna participa.
Lançado em Dezembro de 2006, este projeto começou com o anúncio do diagnóstico às mães seropositivas e em seguida às crianças, explicou Pierre Robert, responsável pelo programa Criança e HIV/Sida da UNICEF no Malí.
“O anúncio é muito menos dramático aos seis anos que aos dezesseis; a adolescência é sempre uma etapa complicada”, disse ele. “Gerir a descoberta de sua seropositividade é muito doloroso nesta idade. Eu me lembro de uma menina de 14 anos que nos disse: “por quê esperaram tanto para me contar?”
Resultados extraordinários
Com cerca de 1.500 crianças seropositivas registradas no hospital, 600 delas em tratamento, instaurar uma estrutura como esta era uma necessidade urgente, estimou a Dra Aissatou Coulibaly, encarregada do atendimento das crianças seropositivas da unidade de pediatria.
“É preciso que haja um acompanhamento global para se conseguir um sucesso absoluto do tratamento, e isto inclui um acompanhamento psicossocial”, disse ela.
Dois médicos e uma auxiliar de enfermagem, funcionários do hospital, trabalham em tempo integral para o projeto. Em menos de três meses, Maimouna e cerca de 20 outras crianças souberam de sua seropositividade e frequentam regularmente as sessões de discussão organizadas em Bambara, uma das línguas locais.
“É horrível dizer a uma criança que ela é seropositiva, ninguém quer fazê-lo, mas pudemos perceber que se tivermos a coragem de fazê-lo, os resultados podem ser extraordinários”, afirmou Robert. “Há uma criança de sete anos que não queria vir ao hospital antes de saber que era seropositiva, mas agora ele vem brincar, gosta do lugar.”
A criança “precisa entender o que acontece em seu corpo. Pela primeira vez, ela sabe porque toma os remédios. Existe então uma verdadeira adesão ao tratamento, ela entende que se tomar os remédios, pode continuar saudável”, acrescenta ele.
Por quê esperaram tanto para me contar? |
Graças a uma cooperação Sul/Sul, vários médicos terapeutas do Ruanda vieram compartilhar sua experiênciano anúncio do diagnóstico à criança.
Durante as sessões educativas, as crianças, sentadas em uma esteira, olham as 15 fichas de imagens que as doutoras Isabelle Traoré e Anta Diallo lhes mostram. Trata-se do corpo, das células CD4 que permitem avaliar a resistência do sistema imunitário ou ainda de medicamentos antiretrovirais.
Pelo fato de estarem em grupo, as crianças tomam consciência de que não são as únicas infectadas pelo vírus.
“Aí criam-se laços de solidariedade entre os grupos de jovens”, nota Robert. “Eles se tornam amigos, trocam números de telefone. Tornam-se unidos através da doença, mas no bom sentido: eles sabem que podem conviver de maneira positiva com ela.”
Diálogo de confiança
Apesar de tudo, o anúncio da seropositividade é sempre difícil: em 15 por cento dos casos, segundo estatísticas de outros países, as crianças reagem mal à notícia.
“Quando não são as crianças, são os pais; alguns recusam totalmente de ouvir o que temos a lhes dizer, dizem que tem medo que a criança não seja grande o suficiente para saber que tem o HIV/Sida”, disse a Dra Diallo.
A equipe médica tenta então progredir lentamente nas discussões para anunciar o diagnóstico.
“É importante que se instale um diálogo de confiança. Por causa da estigmatização, certas crianças nem conhecem a doença”, explicou Diallo.
Para Oumou, avó de Maimouna, que manteve o segredo da doença de sua neta durante 12 anos, o anúncio do diagnóstico foi um alívio, em um país onde 1,7 por cento da população é seropositiva e onde a estigmatização é enorme.
“Eu dizia à Maimouna que ela tinha uma doença do sangue mas não dizia nada mais porque eu tinha medo”, explicou Oumou. “Eu fico aliviada de ter-lhe dito o que tinha. Eu pude enfim lhe explicar que é por causa da Sida que seus pais morreram”.
O anúncio do diagnóstico, que no início é geralmente um choque psicológico para os pais, permite a longo termo de desculpabilizá-los, estimou Robert.
“Não existe mais nenhum segredo, cria-se uma relação entre pais e filhos que não existia antes; as crianças então dizem aos pais: “não se esqueça que eu tenho que ir ao hospital receber meu tratamento às 16 horas”, nota ele.
Maimouna ainda não se sente pronta a compartilhar este segredo com seus amigos. “Eu sei que eu sou seropositiva, mas eu não contei aos meus amigos, só minha avó sabe, e eu só falo disso aqui no hospital”, confessa ela.
Na espera de poder documentar esta experiência e compartilhá-la com outros países da região, disse Robert: “Existe um potencial para criar uma nova geração de pessoas seropositivas que não viverão com o HIV/Sida como fizeram seus pais”.
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Tema(s): (IRIN) Cuidados/Tratamento
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[Este boletim não reflecte necessariamente as opiniões das Nações Unidas] |
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