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GÂMBIA: “O remédio contra a Sida” do presidente cria falsas esperanças


Photo: Nicholas Reader/IRIN
O presidente Yahya Jammeh disse curar a Sida com ervas e o Alcorão
BANJUL, 22 Fevereiro 2007 (PlusNews) - Indignação, confusão, esperança ou embaraço: as reações ao anúncio da descoberta de um “remédio contra a Sida” pelo presidente gambiano Yahya Jammeh se multiplicam, enquanto as autoridades gambianas continuam fingindo não ouvir os pedidos de explicações formulados pelos atores da resposta a epidemia.

Em Janeiro, na ocasião de uma reunião extraordinária a Banjul, a capital gambiana, o presidente Jammeh afirmou ter descoberto um remédio à base de plantas medicinais capaz de “curar a Sida” em alguns dias, e anunciou o lançamento de um programa de tratamento.

No final de Janeiro, os 10 primeiros pacientes apresentados como sendo seropositivos começaram o “tratamento milagroso” desenvolvido, segundo o Dr. Tamsir Mbowe, ministro gambiano da saúde, graças “aos conhecimentos da família” de Yahya Jammeh em medicina tradicional e “aos ensinamentos do sagrado Alcorão”.

Este anúncio suscitou a indignação de vários ativistas internacionais da Sida.

“Todos esperamos a descoberta de uma cura contra o HIV/Sida...mas estas afirmações são de ordem divina, elas não tem nenhum fundamento científico e, por conseguinte, não podem ser levadas à sério”, disse ao PlusNews Bede Eziefule, diretor executivo do Centro pelo Direito à Saúde na Nigéria.

O Ministério gambiano da saúde publicou vários relatórios afirmando que os pacientes tinham melhorado, que seu sistema imunitário tinha sido reforçado e que o vírus era indetectável no organismo de alguns deles.

Estas declarações foram acompanhadas de testemunhos transmitidos pela mídia pública, que difundem continuadamente imagens dos pacientes “curados”.

“Eu notei uma grande melhora do meu estado de saúde desde que comecei o tratamento”, afirmou Lamin Ceesay, um dos pacientes que participam do programa. “Eu tenho certeza de que nenhum dos pacientes que estão seguindo o tratamento do Presidente vai morrer”.

Interrogado várias vezes pela imprensa local e internacional, o Ministério da Saúde recusou-se a fornecer informações sobre a composição do tratamento, prometendo que estes detalhes seriam revelados “mais tarde”.

A mídia também emitiu dúvidas quanto às condições nas quais são feitos os exames de saúde dos pacientes antes e depois do tratamento, inclusive os testes de despistagem do HIV.

“As afirmações do presidente gambiano são um insulto à profissão médica”, insurgiu-se Ibrahim Umoru, educador de HIV/Sida na Nigéria. “O presidente gambiano e seu ministro não deveriam ser autorizados a propagar sua ignorância para se apropriar de um problema que desafia todos os esforços efetuados há tanto tempo”.

A taxa de seroprevalência no país é estimada em 2,1 por cento.

Mão de ferro

Desde sua ascensão ao poder em 1993, depois de um golpe de estado, o presidente Jammeh dirige a Gâmbia com mãos de ferro e, segundo várias organizações de defesa dos direitos humanos, multiplica as pressões para limitar a liberdade de expressão. Raros são aqueles que tem coragem de por em dúvida a palavra do Chefe de Estado.

“No clima político atual, eu poderia perder meu emprego”, disse um médico, que preferiu o anonimato.

No entanto, “muitas pessoas são cépticas e tem dúvidas, principalmente nas áreas urbanas”, afirmou Sam Sarr, redator-chefe do Foroyaa Newspaper, um jornal bi-semanal da oposição. Mas “em uma sociedade onde, por falta de conhecimentos, muitas pessoas são fetichistas, a população tem tendência a querer acreditar que o presidente pode ter usado poderes sobrenaturais para encontrar um remédio”.

Face à incerteza que envolve o “tratamento do presidente”, vários ativistas exprimiram sua incompreensão ao constatar o silêncio da comunidade internacional.

Alguns científicos, entre outras na África do Sul, emitiram sérias dúvidas quanto às afirmações do presidente Jammeh e advertiram contra os efeitos potencialmente devastadores de uma tal declaração, mas até agora nenhuma organização internacional pronunciou-se oficialmente.

Um responsável do Programa Comum das Nações Unidas sobre a Sida, (Onusida), explicou ao PlusNews que seu organismo “trabalhava na elaboração de uma resposta coordenada do sistema das Nações Unidas”, esperando poder dizer mais nos próximos dias.

Um especialista da Organização Mundial da Saúde indicou que os organismos internacionais estavam tendo dificuldades em obter informações das autoridades gambianas sobre o “remédio milagroso”.

“Nós pedimos para visitar o laboratório para ver como é efetuado o tratamento, mas não obtivemos nenhuma resposta do Ministério da Saúde”, disse ele.

Falsas esperanças

Portanto, esta intervenção é necessária, afirmou Demba Ali Jawo, antigo presidente do Sindicato da Imprensa Gambiana, em uma entrevista a um jornal local.

“É extremamente urgente que a comunidade internacional venha socorrer os gambianos seropositivos a quem pode-se estar alimentando com falsas esperanças, fazendo com que acreditem que estão curados, quando na verdade não estão”, estimou ele.

Com estas falsas esperanças, corre-se o risco de fazer com que a população pense que não é mais necessário proteger-se da infecção, já que ela pode ser tratada, alertaram vários ativistas, principalmente quando esta “informação” é dada por uma autoridade como o Chefe do Estado.

Como para confirmar estes temores, Ousmane Sanusey, professor gambiano, estimou que “um homem que ocupa uma posição pública como a do Presidente não pretenderia tratar o que ele não pode tratar”.


Tema(s): (IRIN) Cuidados/Tratamento

[FIM]

[Este boletim não reflecte necessariamente as opiniões das Nações Unidas]
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