QUÉNIA: Jovens, sexo e turismo na costa

Photo: IRIN  |
A espera dos clientes… |
MOMBASA, 10 Abril 2007 (PlusNews) - Com o seu filho de seis meses adormecido nos braços, Alice (não o seu nome real), de 17 anos, explica como ela se juntou às crescentes filas de jovens meninas envolvidas no comércio de sexo na costa queniana.
“Quando eu tinha 16 anos fiquei grávida. Os meus pais expulsaram-me de casa e eu abandonei a escola, de modo que eu e o meu namorado decidimos mudar-nos para Mombasa. Depois de três meses ele me abandonou, e eu tive que encontrar maneira de ganhar dinheiro”, disse ela.
Servindo de preferência homens turistas mzungus (brancos), mas também locais, ela não se considera a si própria como prostituta, preferindo ser considerada como alguém que pratica “bangaisha a sheng” [calão queniano] que significa “aliciada para negócio”.
Segundo um relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o turismo sexual está a crescer rapidamente na costa queniana. De acordo com a Direcção Queniana do Turismo, 1.68 milhões de turistas visitaram o país em 2005.
O relatório do UNICEF diz que 76 por cento das meninas entrevistadas achavam que o sexo comercial era uma maneira aceitável de fazer dinheiro.
Esta opinião é secundada por Mathilda Katana, coordenadora da SOLWODI (Solidariedade com Mulheres em aflição), uma ONG queniana que presta apoio a trabalhadoras do sexo comercial (CSW) na costa. Katana trabalha em Mtwapa, um suburbia de Mombasa, onde as trabalhadoras do sexo aprendem novas habilidades, recebem conselho, e são encorajadas a voltar à escola.
“Elas andam por aí a exibir-se. Elas decidiram que assim é que elas ganham a vida e não se importam”, disse ela.
Muitas jovens são forçadas à prostituição por membros da sua família, diz Stella Muchiti Mulama, directora assistente do programa Fala Directa, que produz shows de radio dirigidos à joventude, revistas mensais, e um site na internet.
“Os pais na verdade empurram as suas filhas a fazer trabalho de sexo. Por vezes as mães, que também estão envolvidas no trabalho de sexo, trazem as suas filhas para fazerem o mesmo trabalho”, disse ela.
Outros factores que trazem as meninas para a indústria do sexo incluem pressão de amigas, circunstâncias financeiras e sociais, e baixas aspirações, acrescentou Akinyi.
Alta remuneração
Embora a remuneração varie largamente na indústria do sexo, o potencial rendimento é muito mais alto do que em qualquer outra profissão.
Segundo uma trabalhadora do sexo, 22 anos de idade: “na estação de pouca procura tu acabas te oferecendo por 20 KES (xelins quenianos) [30 cêntimos do dólar americano]. Pode chegar a 5.000 KES [70 dólares americanos] quando há turistas. Eu costumava andar aí e lavar roupa das pessoas. Mas no fim do dia dão-te 150 KES [2 dólares americanos], o que não é nada, disse ela.
É o turismo que traz estas jovens a Mombasa. Por causa do endurecimento das leis em lugares como Ásia, muitos turistas mzungu estão agora a afluir para o Quénia, onde as leis são consideradas não rígidas.
De acordo com Julia, 17 anos, de Mtwapa: “O meu alvo são sempre mzungus, mas também aprecio os locais. Mas os mzungus são os que têm dinheiro”.
Ela acrescentou que por causa da sua idade, ela estava em desvantagem quando fosse para negociar com os mzungus, que ela classifica de ´muito arrogantes´.
“Há duas noites eu estava com um mzungu num bar local. Já tinhamos acertado o preço, mas depois de eu fazer sexo com ele, ele recusou-se a pagar-me. Ele disse que ele tinha estado a pagar-me bebidas, e que esse era o meu pagamento. Quando eu o desafiei ele me bateu”, disse ela, apontando as feridas junto ao olho esquerdo.
Sida e preservativos
O Gabinete de Censo dos Estados Unidos estima que existem actualmente mais de 1,8 milhões de crianças quenianas feitas orfãs pelo Sida, e pelo menos duas jovens entrevistadas pelo PlusNews/Irin disseram que “não têm pais”.
Astrid Winkler é gestora de projecto na Respect, uma ONG australiana que é membro da ECPAT International (Acabar a Prostituição Infantil, Pornografia Infantil, Tráfico de Crianças para Fins Sexuais).
Winkler disse que “vejo isto como um ciclo ´vicioso´ que começa com a pobreza, HIV, negligência, e termina no comércio do sexo na costa.”
Muitas jovens trabalhadoras do sexo têm conhecimento sobre o Sida. Contudo, em muitos casos, elas fazem sexo sem protecção, porque os turistas oferecem mais dinheiro por sexo sem preservativo. O relatório do UNICEF de 2006 diz que mais de 35 por cento das meninas não usavam preservativos a pedido dos seus clientes.
De acordo com o relatório do UNICEF, homens quenianos representam 40 por cento dos clientes que as raparigas têm.
Leis contra exploração sexual
A Organização Internacional do Trabalho estima que há no Quénia cerca de 30 mil raparigas abaixo dos 19 anos de idade envolvidas na prostituição.
Algumas leis contra o trabalho de sexo de menores foram aprovadas pelo parlamento. A Lei da Crainça, de 2002, protege da exploração sexual, prostituição e pornografia as crianças de 18 anos ou menos.
O Código Penal inclui ofensas tais como abuso de menores,e exploração sexual e prostituição de menores, com penas de até prisão perpétua para os culpados.
Em 2006, o Ministério Queniano do Turismo, com a Associação de Hoteleiros e Fornecedores (KAHC) e a RESPECT, introduziram o Código Internacional de Conduta para a Protecção de Menores da Exploração Sexual nas Viagens e Turismo.
O Código é financiado pelo UNICEF, e apoiado pela Organização Mundial do Turismo. Aqueles que subscrevem o Código comprometem-se a “introduzir a cláusula em contratos com fornecedores declarando um comum repúdio à exploração comercial de menores, e a disponibilizar informação aos viajantes através de catálogos e brochuras”.
O Código foi apoiado por 20 distritos quenianos, o Ministério do Turismo e Fauna Bravia, e o Ministério do Interior/Departamento de Serviços de Menores.
Mas apesar deste progresso, Akinyi sente que ainda há muito mais que o governo podia fazer.
”O governo deve pressionar os hotéis e organizações de turismo que ainda não assinaram, e monitorar os hotéis que já o fizeram”, disse ela.
Organizações como a SOLWODI que, desde 1997, e apesar de fundos limitados, têm conseguido recuperar mais de 5.000 jovens meninas do comércio do sexo.
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